Friday, January 06, 2017

Como lidar com ameaças de suicídio

No último dia 25 de dezembro uma moça, aqui pelo Facebook, anunciou que havia ingerido dezenas de comprimidos e que esse era seu presente de Natal para sua família.

Alguns de seus familiares mais próximos, parece que alguns de seus irmãos e sua mãe, responderam a essa mensagem dela, desqualificando-a. Escreveram que ela sempre fazia isso e que sempre era para chamar a atenção.

O tom, tanto dela quanto da família, era bastante agressivo. Era aquele tom de barraco ao vivo, de quem está brigando frente às câmeras em algum programa sensacionalista.

Esses familiares responderam à postagem dela, mencionando que já estavam no hospital, que era sempre assim, e que desta vez não seria diferente. Ou seja, segundo eles, ela novamente estava dando o "show" dela de sempre, e eles novamente a conduziram ao hospital. Diziam que era somente mais uma tentativa para chamar a atenção.

Porém dessa vez foi diferente. Oito dias depois ela veio a falecer.

Como já me abordaram para que eu me expressasse sobre o ocorrido, deixo-lhes aqui minhas breves considerações, as quais considero apenas como um ponto de partida para o debate.

Uma coisa bem básica ao se lidar com uma pessoa que está ameaçando suicidar é não cairmos em dois possíveis extremos: não devemos nos tornar reféns ou (no outro extremo) desafiar a pessoa em questão.

Quem se torna refém acaba gratificando uma série de comportamentos abusivos e assim, muito possivelmente, vai se construindo uma relação abusiva.

Quem desafia brinca com fogo, e não se dá conta de que o desafio, a desqualificação, pode ser exatamente o que está faltando para que a pessoa conclua um suicídio.

É preferível dar atenção, ser acolhedor ou carinhoso, antes que a pessoa comece a fazer suas ameaças. O problema é fazer com que isso ocorra de forma mais efetiva em uma família cujos laços afetivos (principalmente com o suicida) estejam deteriorados.

Muitas vezes as melhores alternativas de solução não estão na família, mas sim em interações fora do ambiente familiar. Já acompanhei diversos casos que somente tiveram um melhor encaminhamento fora do seio familiar. As pessoas em questão precisaram sair de casa, mudar de bairro ou até mesmo de cidade. A gradual renovação de vínculos sociais costuma ser uma alternativa relevante.

Obviamente que, por um mecanismo de generalização, as pessoas costumam adotar padrões de comportamento anteriores para seus novos relacionamentos, e muitos conflitos tendem a se repetir. Porém creio que é muito mais fácil haver mudanças em ambientes renovados do que em interações que já estão totalmente desgastadas.

É importante também lembrar que existem diversos contextos possíveis. Somente uma análise consistente, paciente e apurada desses contextos, das interações do suicida com as pessoas com as quais convive (e de inúmeras peculiaridades envolvidas), é que possibilitará um conhecimento mais apurado de como intervir.

E, para finalizar, vale ressaltar que transtorno mental não é passe livre para se fazer o que bem quer, para abusar das pessoas e não se responsabilizar pelos próprios atos. Aliás, a responsabilização pelos próprios atos costuma ser mais benéfica e reabilitadora do que o contrário.

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